Por Carina Marcondes Ferreira Pedro*
O livro Frei Galvão: Arquiteto do professor Benedito Lima de Toledo nos mostra, por meio de fontes textuais e iconográficas, uma São Paulo ainda pouco povoada, onde capelas, mosteiros e conventos eram os principais pontos de referência dos moradores e viajantes, período em que a influência portuguesa se fazia fortemente presente nos santos de devoção católicos e, consequentemente, na arquitetura religiosa. Foi nesse contexto que o frei Antônio de Sant’Anna Galvão, o Frei Galvão, teve uma importante atuação, projetando obras que marcaram a paisagem da cidade, como o Mosteiro da Luz.
No primeiro capítulo, Mosteiro de Nossa Senhora da Luz: Origens, o autor escreve sobre Portugal, no século XV, mais especificamente, Carnide, próximo a Lisboa, onde se deu o aparecimento da imagem de Nossa Senhora da Luz a Pero Martins e sua humilde família. No local, foi construída uma ermida, sucedida por uma igreja, que foi finalizada somente no final do século XVI. Aspectos arquitetônicos inserem a obra no movimento artístico conhecido como maneirismo em Portugal. O capítulo seguinte, Uma Imagem em São Paulo, trata da chegada da imagem de Nossa Senhora da Luz ao Brasil e a construção da sua capela por Domingos Luís, o Carvoeiro, e sua mulher Ana Camacho, na São Paulo seiscentista.
Com o passar dos anos e a deterioração da capela, Frei Galvão ficou responsável pelo projeto do novo convento no Campo da Luz. Em uma planta de 1810, do engenheiro Rufino José Felizardo Costa, aparece a primeira indicação desse novo edifício, com um “pouso” e um “Jardim Público” nas proximidades. Outros registros importantes são as aquarelas do botânico William John Burchell, de 1827, em que o Mosteiro da Luz aparece exatamente como foi concebido por Frei Galvão, com detalhes arquitetônicos no “estilo jesuítico”. Mais tarde, as fotografias de Militão Augusto de Azevedo mostram alterações no frontispício, voltado para Avenida Tiradentes.
No terceiro capítulo, Muros que resistem ao Tempo, o autor discute a taipa de pilão, conhecida técnica construtiva do período colonial, herança dos invasores muçulmanos na Península Ibérica. Toledo ressalta que os taipeiros e sua técnica não receberam o devido reconhecimento, sendo o Mosteiro da Luz, uma das poucas construções preservadas em São Paulo. Outra característica relevante da Igreja da Luz, abordada no quarto capítulo, é sua planta octogonal, presente também na Capela da Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência, outro projeto relacionado ao Frei Galvão, que foi frade no Convento de São Francisco até sua mudança para o Mosteiro da Luz.
No capítulo seis, Implantação do Edifício, são detalhadas as principais semelhanças entre a Igreja da Luz e a citada Capela Terceira de São Francisco, entre elas, a planta octogonal, a mudança de eixo principal e o pórtico de ambas. Sobre a mudança do eixo principal, o autor ressalta a percepção espacial de Frei Galvão sobre a região da Luz, que a seu ver se tornaria o centro da cidade, por isso a construção deste novo frontispício voltado para atual Avenida Tiradentes. Nos interiores do convento também é perceptível a habilidade do Frei projetista, que desenhou um local bem arejado, até os dias de hoje, com boas acomodações e amplos corredores abertos para pátios com jardins.
No oitavo e último capítulo, Um Documento – O Risco, Benedito Lima de Toledo nos revela a existência de um documento raro, deixado por Frei Galvão, em uma parede do Mosteiro da Luz, onde viveu seus últimos anos de vida. Esse documento, o “risco”, nada mais era do que a representação de um projeto sobre uma superfície, feito, naquela época, com uma ponta afiada. O tal projeto, segundo Toledo, correspondia a um frontispício de uma igreja, que não se sabe a finalidade, mas que lembrava a Igreja do Seminário Episcopal, mais tarde, construída na mesma Avenida Tiradentes.
*Historiadora, designer de interiores e mestre em História Social pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. É autora do livro Casas Importadoras de Santos e seus Agentes, publicado pela Ateliê Editorial, em 2015.