Faleceu, na madrugada deste domingo, 26 de setembro, o poeta e tradutor Frei Bruno Palma, aos 94 anos. A Ateliê Editorial lamenta a morte de um dos maiores tradutores do país, que deixou um legado essencial para a literatura. Na editora, Palma publicou as obras traduzidas Amers / Marcas Marinhas, de Saint-John Perse, e Duplo Canto e Outros Poemas, de François Cheng, que para o editor Plinio Martins Filho: “considero uma das mais importantes no catálogo da Ateliê”. Além das traduções, Bruno Palma lançou o livro de poesias Cirandas. Pela Com Arte (Editora do Curso de Editoração da ECA-USP), Palma publicou as obras O Mar e Búzio e Porque é Noite. Há também no catálogo do selo: Bruno Palma, Escolhedor de Palavras – Ensaio sobre a Arte e o Ofício de um Tradutor, de Marcus Fabiano Gonçalves.
Ivo de Souza Palma nasceu em 1927, na cidade de Araraquara (SP). É conhecido pelo nome religioso, Frei Bruno Palma, da Ordem dos Dominicanos e assina suas traduções com seu nome literário Bruno Palma. Recebeu da sua família o gosto pela leitura dos melhores autores da literatura portuguesa e brasileira e, desde cedo, pôde lê-los, em sua casa, por iniciativa própria ou como tarefa escolar. O mesmo se pode dizer do seu contato com grandes autores estrangeiros, em boas traduções.
Quanto à sua experiência tradutória, ela começou no ginásio, onde, nos cursos de latim, francês e inglês, ministrados desde o primeiro ano ginasial, havia, como prática habitual, a tradução para o português de textos escritos nessas línguas, e as chamadas “versões”, do português para elas. Fez seus estudos de filosofia e teologia na França.
De volta ao Brasil, foi ordenado sacerdote, em 1957, por D. Helder Câmara e exerceu suas atividades sacerdotais e magisteriais em várias cidades brasileiras. Começou, desde 1958, a realizar traduções das obras de Saint-John Perse e publicá-las, primeiro em jornais depois em livro. Voltando da França, em 1976, continuou a se dedicar à tradução das obras de Saint-John Perse. Entre elas, figuram Anábase (1979) pela qual recebeu o Prêmio Jabuti, em 1980; e Marcas Marinhas (Ateliê Editorial, 2003) que lhe valeu o prêmio da Academia Brasileira de Letras, em 2004. Em 2011, publica Duplo Canto e Outros Poemas (Ateliê Editorial), que congrega três obras poéticas do poeta sino-francês François Cheng (1929): Double Chant, Cantos Toscans e Le Long d’um Amour. Publicou também Cirandas, livro de poesias.
OBRAS PUBLICADAS PELA ATELIÊ
Este é um canto épico de louvor ao mar como modelo de grandeza e de toda realização humana. Saint-John Perse (1887-1975), vencedor do Prêmio Nobel em 1960, funde diversas tradições míticas e tece um elogio à Criação. Para Bruno Palma, o autor “transmite um rigor de incomparável liberdade. Jamais teme as palavras”. Esta edição bilíngue é um marco na tradução poética brasileira pelo prodigioso trabalho de recriação feito por Bruno Palma, que assina também a cronologia, a introdução e as notas.
Traduzir poesia é traduzir o intraduzível. São raros os que o fazem. E mais raros ainda os que o conseguem com proveito. Bruno Palma é um desses casos. Passou para o nosso português as páginas mais belas de Saint-John Perse. Recriou ritmos e ambientes quase intransponíveis. Criou novas palavras, e deu a outras novo lustro de vida, novas conotações de convivência. Agora, Palma traduz François Cheng. Poeta sino-francês, Cheng é um sintetizador dessas duas extraordinárias vertentes de civilização. Bruno se empenha sobretudo junto às figuras de linguagem, que em Cheng resultam de interação profunda com a natureza, e segue as linhas essenciais do ritmo chenguiano. A simbiose de Cheng enlaça a tradição de literatura e pensamento zen, na sua expressão ideográfica distinta, à nossa tradição radicalmente inovadora da perspectiva aberta por Mallarmé. Integrador de linguagens e culturas, Cheng muito nos enriquece a vivência literária: no caso dos leitores de língua portuguesa, graças ao pleno encontro de Bruno Palma com o mestre sino-francês, recriando-o admiravelmente em nossa língua.
Essas canções infantis – ditas “de ronda”, ou “de roda” – fazem parte da nossa infância e, por isso, sempre despertaram em mim o desejo de escrever poemas sobre elas. Adotei, como Villa-Lobos, o nome de “cirandas”. E tentei fazer o que ele fez – e genialmente: assumi-las numa forma erudita, sem perder seu encanto e seu frescor. Assim, escolhi o soneto: forma de beleza imperecível e exigente, pela sua concisão e musicalidade. E é essa musicalidade que procurei manter nas minhas versões pessoais do patrimônio comum dos povos brasileiro e português. E, visto que muitas dessas cirandas têm várias versões, optei pela mais normativa gramaticalmente e mais sugestiva no seu conteúdo, ciente de que, primeiro: a forma e o ritmo de um poema fazem parte essencial desse conteúdo, já são significativos e poéticos por eles mesmos; depois, nada garante que as minhas opções reencontrem o “original” das rondas…