Hoje, 15 de outubro de 2015, a partir das 19h, acontece o lançamento do livro Viagem a um Deserto Interior, de Leila Guenther, na Casa das Rosas (Avenida Paulista, 37 – Bela Vista – São Paulo). A autora fez, ela mesma, uma seleção de poemas e ilustrações (feitas por Paulo Sayeg), exclusiva para os leitores do Blog da Ateliê conferirem alguns trechos do livro, em primeira mão. “Espero todos no lançamento desta noite”, convida.
CONTORCIONISMO
Já caibo numa
Caixa de sapato
Mas o que eu queria mesmo
Era ser trapezista
A CHAT WITH CHET
Gosto mais de sua voz agora
grave, baixa, pesada
pela força de atração da terra
sem aquele caráter flutuante de quando você era
um rapaz bonito e perfeito.
Gosto da economia de suas notas
e da sonoridade que elas adquiriram
depois que você perdeu os dentes.
Gosto mais de você sem dentes
e dos sulcos que surgiram das profundezas de sua face
depois que a máscara uniforme de garoto se quebrou.
Queria ter podido afagar todo esse seu rosto verdadeiro
quando você caiu daquela janela em Amsterdã.
LESS
Nunca tive um lugar que fosse meu.
O que tenho são mochilas, caixas de papelão, objetos
[descartáveis usados inúmeras vezes.
Me resguardo atrás das paredes frágeis de embalagens e
[sacolas de plástico.
Quando acordo durante a noite, é sempre em outro lugar.
[Um dia a porta fica à direita; no outro, a cama é
[estreita. As vezes esbarro em objetos que
[surgem do vazio.
Nunca tive para onde voltar. Não lembro como é tomar
[água em copo.
Vivo nos livros. Os que estão guardados, longe. Fiz deles
[minha casa. Construo com páginas e paciência o teto,
[as janelas, o minúsculo quintal.
Já faz tempo que a escova de dentes não habita uma
[gaveta.
Já faz muito tempo que desaprendi a utilidade dos
[cabides.
CONSTRUINDO A PAISAGEM
Usando a natureza
Para imitar a arte
Reduzindo o cascalho
A abstração
Petrificando a distância
Para sustentar o tempo
Assim engendra a cabeça raspada que o sol cresta
De nenhum ponto do espaço se veem as quinze partes:
Uma está sempre escondida atrás do todo
Em Ryoan-ji
Não há nada mais vivo do que as pedras
E para quem as dispõe
Já não é possível sair do jardim
Sem perturbar a ordem do arado
DIA DE NATAL:
em silêncio ela agradece
pelo filho que não teve