Com a Palavra

Com a Palavra nº 21 – Existe uma “maneira paulistana” de fazer teatro?

 

O livro O Espetáculo da Cultura – Teatro e TV em São Paulo (1940 – 1950), segunda edição revista e ampliada, publicado pela Ateliê Editorial, foi concebido originalmente como uma tese acadêmica, David José Lessa Mattos vai fundo na investigação das raízes da criação artística e da produção cultural em São Paulo, especialmente aquela voltada para o teatro e a televisão.

O ponto de partida são dois eventos que o autor considera seminais: a inauguração do Teatro Brasileiro de Comédia, em 1948, e a da PRF-3 TV Tupi-Difusora, a pioneira das emissoras de televisão brasileiras, em 1950.

Os leitores do Com a Palavra puderam ler um trecho do texto A Arte do Espetáculo amador: São Paulo, presente na obra.

A Arte do Espetáculo amador: São Paulo
por David José Lessa Mattos

Ao iniciar-se o século XX, a arte do espetáculo teatral em São Paulo não era uma diversão urbana ampliada, não ganhava as ruas, não invadia a cidade, não era sinônimo de cosmopolitismo tal como acontecia no Rio de Janeiro. Lá, com efeito, sob a influência marcante do teatro de revista e contando com um certo número de dramaturgos e comediógrafos nacionais, a arte do teatro era um acontecimento que fazia pulsar a vida noturna, um entretenimento social realizado por artista profissionais e festejado por um grande e virado público.

Em São Paulo, certamente aconteciam também apresentações de teatro profissional, grandes espetáculos dramáticos, comédias e, mesmo, óperas e operetas, encenados notadamente por companhias estrangeiras. O público que costumava assistir a essas representações especiais era formado quase que exclusivamente por pessoas da elite. Era um público geralmente de posse que não perdia a oportunidade de ver as montagens das companhias teatrais vindas do Rio de Janeiro e, sobretudo, das companhias europeias que se apresentavam, vez por outra, nas principais cidades do país. Antes mesmo da inauguração de seu Theatro Municipal, em 1911, São Paulo podia encenar grandes espetáculos, pois já possuía alguns teatros amplos e bem instalados como, por exemplo, o teatro São José, no viaduto do Chá, ou o Politeama, no Anhangabaú, ou ainda o “primeiro” Teatro Santana, na rua Bela Vista.

No início do século, poucas foram as realizações de teatro profissional em São Paulo por iniciativa de artistas e dramaturgos locais. Em geral, as raras tentativas nesse sentido limitaram-se a alguns espetáculos que buscavam seguir tendência dominante nos palcos cariocas, na linha das comédias de costume e do teatro de revista.

[…] Diferente do Rio de Janeiro, em São Paulo a arte do espetáculo urbano apresentou características diferente relacionadas à presença maciça na cidade de grandes contingentes de trabalhadores europeus, principalmente italianos e espanhóis. Já em fins do século XIX e inícios do XX, a atividade teatral em São Paulo vai adquirir importância social em função, sobretudo, da existência de inúmeros grupos teatrais amadores que começaram a florescer nos bairros populares, junto à população dos trabalhadores imigrantes das primeiras indústrias. Realizada quase que exclusivamente por imigrantes estrangeiros e por seus descendentes, desde cedo a arte do teatro e do espetáculo urbano adquire em São Paulo características eminentemente amadoras.

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