Com a Palavra

Com a Palavra n.33: relato de uma sobrevivente da Ditadura Militar no Brasil

Os anos que perduraram a Ditadura Militar no Brasil, entre 1964 até 1985, tiveram impactos significativos na vida social, cultural e política de uma geração.

Principalmente no âmbito de desaparecimentos de pessoas que não concordavam com o poder dos militares. Caso conhecido – e que veio à tona por causa do filme Ainda Estou Aqui– foi do ex-deputado Rubens Paiva. Na obra cinematográfica, seguimos o desespero de sua esposa, Eunice, na luta por saber o que aconteceu com o seu sumiço após ser levado para interrogatório pelo sistema político ditatorial.

Para se aprofundar no contexto histórico e conhecer mais os relatos de pessoas perseguidas pelo regime, a Ateliê Editorial indica a obra Amor, Luta e Luto – No Tempo da Ditadura, de Maria do Socorro Diógenes. Publicado em 2021, o livro tem por objetivo mostrar um recorte do período da ditadura civil-militar, principalmente durante a fase mais violenta, a fase das prisões, das torturas, dos assassinatos e dos desaparecimentos dos opositores.

A autora também denuncia o brutal assassinato de Ramires Maranhão do Valle, seu ex-companheiro, um jovem pernambucano morto aos 23 anos, no Rio de Janeiro em 1973.

Além disso, o leitor toma conhecimento de como eram as ações dos grupos revolucionários de oposição à ditadura, além de mostrar a difícil vida dos militantes na clandestinidade.

Neste número, os assinantes do Com a Palavra leram com exclusividade um trecho do capítulo Meu Mundo Caiu, que faz parte da obra:

Meu Mundo Caiu por Maria do Socorro Diógenes

20 de abril de 1972, o pior dia da minha vida. Há mais de quinze dias que eu me encontrava presa. Tinha conseguido resistir sem abrir os pontos e os contatos com os operários. Naquele dia, mais ou menos às duas horas da tarde, o torturador Miranda, acompanhado do torturador apelidado de Peixinho, chegou diante das grades da minha cela gritando: “Isaura, quem é Isaura, você conhece a Isaura Estamos com a Isaura!” O Peixinho, imitando voz feminina: “Eu quero falar com a Laura!” Não falei nada e comecei a chorar, um choro convulsivo e forte. Deduzi que ninguém avisou a minha prisão para ela. Eu era responsável pelo dinheiro do aluguel. Todo mês eu recolhia a parte do operário Marlúcio, que trabalhava na Santista, completava com o meu salário e levava para Isaura. Como não apareci, ela, desesperada, resolveu me procurar na fábrica e eles a prenderam.

E o Miranda: “Ah! Agora você chora! É a primeira vez que ela chora”. Chorava de dor, de tristeza, de revolta, pois eu estava ali toda machucada, quebrada, disposta a dar a vida para não falar dos contatos com os operários, seriam as únicas pessoas que daria para segurar, porque ninguém sabia e, de repente, ver tudo desabar diante dos meus pés. Isaura era a mulher de Geraldo Ferreira dos Santos, o Gorki, mãe de cinco filhos pequenos, não dava para ficar presa e ser torturada.

Quando o Geraldo partiu, apresentou-me um operário da Santista, seu amigo, o Moreno, cujo nome era Marlúcio. Eu deveria encontrá-lo todos os meses, após a data do pagamento, pois ele me entregaria vinte cruzeiros, correspondentes à metade do aluguel da sua casa, a outra metade, eu completaria e levaria para Isaura. Geraldo não tinha ido para São Paulo por tarefa partidária, mas em busca de emprego, pois vivia numa situação de extrema pobreza.

Durante a sessão de tortura, os agentes da repressão falaram que estavam com a Isaura na Santista para ela mostrar quem era o operário que dava o dinheiro do aluguel. Eu sabia que a Isaura não o conhecia. Os agentes estavam barbarizando na fábrica. Imaginei o terrorismo que eles poderiam praticar com os operários. Então falei que se tratava do operário da tecelagem de apelido Moreno, cujo nome era Marlúcio. Acrescentei que Marlúcio não era ligado ao partido, mas apenas um amigo pessoal de Geraldo. Paralelamente, encontraram com Isaura cartas com o endereço em São Paulo e prenderam Geraldo, levando-o para um centro de torturas onde caiu nas mãos do torturador Fleury, sendo depois enviado ao Doi-Codi do Recife. Além das cartas também encontraram pacotes de documentos do partido que eu lhe pedira para guardar.

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