Ateliê Editorial publica coletânea ‘O Meu Dante’ com textos de escritores brasileiros sobre Dante Alighieri

Os sete séculos de distância entre os leitores de hoje e o autor da Divina Comédia testemunham a riqueza das leituras geradas pelo mestre florentino, também em solo brasileiro. Dante Alighieri, ao mesmo tempo antigo e moderno, torna as fronteiras obsoletas, ressignifica o valor da tolerância e da aceitação das diferenças, e conduz por uma jornada inesquecível, enquanto fala de almas danadas, demônios, castigos, sofrimentos, anjos, santos, amor e salvação. Em torno dessa atemporalidade do texto do poeta italiano, a Ateliê Editorial publica a obra O Meu Dante, organizada por Maria Cecilia Casini. O livro traz testemunhos de diversos autores e professores sobre a importância artística que Dante Alighieri sempre suscitou na cultura brasileira.
São textos em torno da forte presença de Dante nos intelectuais de vastas formações e áreas de atuação. Segundo a organizadora: “Nessas páginas, o leitor encontra vozes de culturas diferentes, que, no entanto, se entrelaçam e se unem ao mostrar o quanto Dante lhes pertence, dando testemunho de um uso cuja apropriação vai além das simples fronteiras”.
A primeira edição do livro foi idealizada em 1965 pelo professor Edoardo Bizzarri, histórico diretor do Instituto Cultural Ítalo-Brasileiro (ICIB) − Casa de Dante, que tinha chegado ao Brasil depois da guerra, enviado pelo governo italiano. A presente edição reproduz os textos originais na ordem em que apareceram na primeira edição, incluindo o breve prefácio de Bizzarri e as apresentações biográficas de cada participante. Mais tarde, em 2021, Maria Cecilia Casini organizou a coletânea acrescentando textos atuais de nomes importantes da literatura. A nova publicação da Ateliê Editorial traz em um volume os escritos dos convidados organizados nos dois períodos: 1965 e 2021.
Participam da coletânea, entre outros, Alfredo Bosi, Haroldo de Campos, Alceu Amoroso Lima, Ana Maria Machado, Hilário Franco Júnior, Paulo Franchetti, Evandro Affonso Ferreira, Marco Lucchesi, Ugo Giorgetti, Eduardo Henrik Aubert, Luciano Maia, Cândido Mota Filho, Miguel Reale, Otto Maria Carpeaux, Dante Milano e Celso Lafer.
Maria Cecilia Casini é formada no Liceo Dante e na Universidade de Florença, é doutora em Teoria Literária e Literatura Comparada pela Universidade de São Paulo, com pós-doutorado na Universidade L’Orientale de Nápoles. Professora de Literatura Italiana no Departamento de Letras Modernas da USP, é autora de diversos estudos sobre Literatura Clássica Italiana.
TRECHOS DA OBRA
A cada dia visito a Comédia. Mas não me pronuncio: como se fosse um bem intransmissível. Herança dos estudos neoplatônicos? Quem sabe um incompleto parricídio? Uma zona de guerra que apressa ao silêncio. Consonante? Dissonante? – MARCO LUCCHESI Temos, cada um de nós, o seu Dante de uso próprio, como temos igualmente um Dante para cada idade Dante é, essencialmente, um criador de formas, um poeta-inventor, um pesquisador incansável da linguagem. Em suma: um poeta experimental. Um poeta de vanguarda |
Desde criança Dante aparece e reaparece na minha vida em períodos desiguais, frequentemente de surpresa. É, num certo sentido, um fantasma que assoma quando menos espero. – UGO GIORGETTI |
A Divina Comédia é um verdadeiro monumento dedicado à elevação do espírito e da civilização. Como um hábil patologista de almas, Dante expõe com detalhes as nossas faltas, fraquezas, defeitos e, por que não, nossa capacidade de causar o mal a outrem. – PAULO SALDIVA |
Dizem as interpretações bem-intencionadas e convencionais que o caminho de Ulisses é paralelo e ao mesmo tempo o inverso do de Dante, que também chega ao sopé do Purgatório. A diferença está em que Ulisses quer fazer o caminho pelo atalho da Racionalidade, enquanto Dante escolhe o mais longo e mais seguro caminho da Fé. Este o leva a percorrer o Cone do Inferno para discernir a natureza ilusória do Mal. – FLÁVIO AGUIAR Muitas vezes privilegio demais minha solidão relendo Dante − solidão de complexa substância poética Ler a Comédia, assim, é uma experiência inesquecível. Primeiro, porque o poema, a despeito da forma rigorosa do metro e da estrofe, conserva até hoje um frescor inolvidável As leituras de Dante, cujo percurso pelo inferno, purgatório e paraíso pode ser visto justamente como metáfora da trajetória pessoal de cada humano, daí, talvez, o alcance universal e plurissecular
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